domingo, 25 de fevereiro de 2007

Conflito de civilizações ou de valores?

Álgebra, geometria, trigonometria, astronomia, filosofia e medicina são alguns dos muitos progressos científicos e humanos que os árabes contribuiram significativamente ao mundo. A cultura árabe embebida da religião muçulmana já foi um ambiente fértil para grandes mentes e grandes civilizações.

Coloquemos os pingos no Is.

Está claríssimo que o atual obscurantismo no mundo árabe é fruto desses árabes contemporâneos, e não dos árabes de forma genérica. É fruto desse Islã, e não do Islã.

O jihadismo desastroso que presenciamos hoje não é a revolta de um povo muçulmano oprimido contra o ocidente opressor. Não é uma revolta dos pobres do mundo contra os ricos do mundo. Não é uma reação cultural à depravação ocidental de morais.

Grande parte do povo muçulmano é oprimido sim, mas o opressor não é o ocidente, é o próprio governante. De todos os países com maioria muçulmana, apenas a Turquia tem um regime que podemos chamar de democrático, onde os três poderes têm igual representação e há relativa liberdade de expressão. A esmagadora maioria restante é governada no fio da espada por uma elite ditatorial, como Saddam governava o Iraque, como Assad governa a Síria, como Abdulah governa a Arábia Saudita e como o Conselho Guardião (designado pelo Aiatolá) governa o Irã.

Grande parte do povo muçulmano é pobre e vive na miséria sim. Arábia Saudita por exemplo, tem um PIB per capita similar ao da Argentina e 30% maior que o do Chile. Enquanto a Argentina tem 97% de sua população >15 anos alfabetizada e o Chile 96%, a Arábia Saudita tem apenas 79%. A Argentina e o Chile ocupam os lugares 34 e 37 no índice de desenvolvimento humano, respectivamente. A Arábia Saudita ocupa 77º lugar. O Brasil tem aproximadamente o mesmo PIB per capita que o Irã, mas o primeiro tinha em 2002/2003 91% da sua população em idade escolar estudando, enquanto no Irã esse número cai para 69%. O Brasil (que não é nenhum exemplo de desenvolvimento humano como todos sabemos) ocupa o 63º lugar, enquanto o Irã ocupa o 99º.* Está claro que no mundo árabe vontade política é o que falta, não dinheiro, que está todo concentrado em um mínimo grupo de famílias oligárquicas que dominam o petróleo, e deixam propositalmente o povo na miséria. Yasser Arafat, o idealista, tinha como única fonte de renda o salário da Autoridade Nacional Palestina (cujos recursos vinham de doações dos EUA e UE). Ao morrer, ele deixou de herança 300 milhões de dólares para a esposa que vive em Paris. Os territórios palestinos têm PIB per capita estimado em $2.302, aproximadamente 3,5 vezes menor que o do Brasil ($7.790); ou seja, não é bem uma situação de bonança financeira Palestina que levou Arafat a roubar esse dinheiro todo.

Daniella Cicarelli, Hugo Cháves, sexo e violência explicitos na TV, cueca de dólares, Big Brother Brasil, Bispo Rodrigues, revisão do Holocausto, Garotinho, crianças sendo arrastadas pelo asfalto, Guantánamo Bay, xenofobia européia, castração de clitóris e e escravização da mulher. É claro que o mundo passa por uma crise de valores. Parece que a Revolução Francesa e o Iluminismo foram há tanto tempo atrás que já os esquecemos, ou os consideramos tão inalienáveis que não lutamos mais por eles. Certamente, temos que ter muito clara a visão que o extremismo religioso não é a solução para a crise de valores – na verdade é uma das causas. A saída é mais iluminação e menos obscurantismo, mais igualdade e menos adestração, mais pluralismo e menos fundamentalismo, mais democracia e menos teocracia. Temos que ver muito claramente que o problema moral da civilização como um todo não está no sistema, mas sim nas pessoas que vivem nele. A história já demonstrou que é possível sintonizar iluminação com religião. O problema não está no livro, mas nos olhos de quem o lê.

*Fonte: Human Development Report 2005 – Acessado em Fev/2007. http://hdr.undp.org/reports/global/2005/pdf/HDR05_HDI.pdf

Nenhum comentário: